terça-feira, 23 de setembro de 2014

digerindo a solidão


Entrou em seu quarto, abriu as janelas e mergulhou na sua cama para olhar o céu estampado de estrelas. Acendeu um cigarro e colocou “Redondo Beach” para tocar, no repeat. Ficou imaginando as cenas cuspidas pela voz da Patti Smith enquanto passava as mãos pelos cabelos (sua mania de todas as noites antes de dormir, já que não tinha ninguém pra lhe fazer carinho) , enquanto desejava que uma estrela cadente passasse ali, no momento do refrão.

Mas não aconteceu.

Tirou a roupa e sentiu-se livre de todo o dia que passou. Levantou da cama e foi em direção ao banheiro. Ligou o chuveiro e esperou a água esquentar bastante, até fazer com que o banheiro ficasse úmido, parecendo uma sauna. Entrou debaixo da água quente e começou a cantar em voz alta, livrando-se das reminiscências do dia anterior. Queria ficar ali debaixo pra sempre, molhando os cabelos e todo o rosto, deixando os dedos enrugados de tanta água quente...
Finalmente desligou o chuveiro e colocou o roupão convencional. Voltou para o quarto, para a cama, para a meia-luz e para a janela.
Seu gato já estava confortável debaixo dos lençóis e ela acendeu mais um cigarro; desta vez o tragaria com o chá que havia preparado antes de entrar no quarto. Tomou um gole de chá e deu mais um trago intenso em seu cigarro de menta. “De menta pra não deixar gosto ruim”, dizia para os curiosos. Mas a menta já estava tornando-se parte do seu enjôo diário, então ela prometia todos os dias que iria parar de fumar.
Ela queria parar de fumar, de beber e de sair para lugares que envolviam bebida e cigarros. Ela queria parar de comer animais e de fazer sexo sem amor. Ela queria ser uma estrela ou um gato para dormir o dia inteiro e acordar à noite.
Deitou-se na cama de lençóis pretos e travesseiros brancos. Deitou nua, para sentir a sua cama por inteiro e assim, descansar melhor. Voltou a olhar as estrelas e pensou na imensidão do céu e na vontade de estar tão longe dali. Olhou para seu gato – ele parecia compreender. Desligou o abajur cor-de-rosa e tentou dormir ao som da voz que mais adorava – a voz do silêncio.

Ela queria o mundo e nunca estava satisfeita com o mundo que tinha.

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