segunda-feira, 24 de novembro de 2008

para você,

foto por João Coutinho


O sorriso que não sai do rosto desconcentra.
As palavras não conseguem sair da minha cabeça, não consigo transmiti-las pro papel. Eu deveria me preocupar com a distração, mas meu coração pula de alegria quando eu viajo nas lembranças de um final de tarde com o céu estampado de nuvens que parecem algodão se escondendo atrás de montanhas de pedra, junto com a chuva fina que São Paulo já perdeu. Eu gostaria de parar o tempo e repetir as doses de olhares tranqüilos e apaixonados, repetir as palavras, ouvir de novo e abraçá-lo como se fosse o último dia, só por hoje. Eu preferia ser romântica e escrever cartas de amor, mas a racionalidade faz com que eu te mostre o caminho verdadeiro, pois o da fantasia é fantástico demais para a realidade da distância. Mas o adeus não é pra sempre. Ele é a força que faz com que eu queira insistir nas minhas loucuras de sair daqui e pular em braços que até então eram desconhecidos e que ao mesmo tempo são os braços mais confortáveis que já me abraçaram. Perdi o medo e a vontade de querer saber o que será de mim daqui pra frente. A realidade exige que eu a encare de fato. Por isso vou manter esse sentimento guardado dentro de mim; por isso vou segurá-lo pela mão e saltar no primeiro abismo em busca dos meus sonhos.


Penso no dia em que tudo isso vai começar...

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

explode teu peito,menina.

foto por: João Coutinho
É muito mais do que eu imaginava que seria. É bem mais doce do que o favo de mel que eu experimentei no interior da cidade. É algo que domina o corpo inteiro, faz os pêlos arrepiarem, faz-me tremer. É bem mais bonito do que os poemas de amor que eu leio antes de dormir. Bem mais profundo do que as palavras Saramago ou Machado de Assis. É bem mais desafiador do que quando tento desafiar meu medo de altura. É bem melhor do que deitar pra dormir em lençóis novos depois de tomar banho. É muito mais gostoso do que tomar sorvete de amora na praia que parece raspadinha no verão. É mil vezes melhor do que escutar Chico Buarque baixinho, na poltrona do meu quarto com papel e caneta na mão. É bem mais emocionante do que qualquer filme romântico. É bem mais excitante do que “nove semanas e meia de amor”.
É muito mais do que eu imaginava que seria e mal cabe no meu coração. É bem maior do que o meu coração. É bem maior do que meu corpo inteiro e bem maior que minha fantasia.
Quero preencher-me.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

do verbo apaixonar.

foto por: Day Medeiros
Meus olhos ficaram confortavelmente fixos em uma direção por alguns segundos, quando alguém me interrompeu perguntando se o café estava pronto. Pisquei e respondi que não sabia. (Maldito aquele que me faz dispersar quando estou viajando pelo meu pensamento apaixonado).
Tentei voltar meu pensamento ao lugar distante de onde veio todo esse sentimento que faz meu peito explodir. Consegui finalmente fechar os olhos e lembrar-me daquele que fez meus dias de chuva sorrirem, que me abraçou por completo, deixando seus braços encaixarem nos meus, sem medo do que iria acontecer depois.
Abri os olhos, mas ainda longe, meus pensamentos não voltaram para o presente, para o que eu realmente deveria me importar, para o trabalho acumulado, para as preocupações diárias... Meus pensamentos continuaram tão longe quanto eu gostaria de estar. Eles me prendem e fazem com que meu corpo se arrepie de lembranças. Eles me confundem e me enraivecem.
As paixões me agridem, deixam marca e fazem doer meu estômago com seu ácido corrosivo. Elas não têm piedade quando fazem com que eu me perca no seu jardim que se transforma em labirinto, elas simplesmente aparecem sem se importar com a minha ordem de não querê-las perto de mim; dentro de mim.
Tudo poderia ser mais fácil, mas infelizmente o ser humano ainda não descobriu um antibiótico para fazer arrancar as paixões de dentro da gente como num truque, estalando os dedos.
Fecho os olhos novamente, dessa vez tentando seriamente voltar para o mundo real. Respiro vagarosamente até meu pensamento ficar sem resquícios de pessoas, até meu pensamento ficar vazio. Tão vazio quanto eu, antes de conhecer a paixão.
Finalmente volto pra rotina.
E as pessoas falam, olham e puxam conversas sem sentido.

Apaixonar-se é um sofrimento opcional.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

uma carta. (para B.W.)


Hoje o céu está mais claro e está caindo a ficha: “nem tudo é o que parece ser”. Sorriso nos lábios, tentando encontrar motivos para achar que eu fiz a coisa certa. Tenho medo desse meu jeito impulsivo de ser. Medo de fazer coisas que eu não deveria. Medo desse meu jeito de fazer tudo sem pensar e medo de trovões antes da chuva. Estou super feliz, obrigada! Mas ao mesmo tempo estou me sentindo saturada de alguns certos assuntos que sempre ficam ali, empacados e não tomam outro rumo. A minha cabeça fica esgotada de problemas que eu criei. Pra todos eles, eu sei que existe uma solução, mas eu tenho um caso sério a ser tratado: eu penso em todas as possibilidades para resolver problemas antes mesmo deles acontecerem. Acho que aprendi isso com você à um tempo atrás.
Indução. E eu fico pensando que tem tanta gente no mundo com os mesmos problemas que os meus, ou até mesmo piores. E eu me culpo por sentir-me culpada, me culpo por reclamar tanto. Mas é sempre assim, só aprenderei a valorizar quando eu perder tudo de uma vez. Você sabe como eu sou.
É sempre assim que as coisas acontecem né? Nós nunca estamos satisfeitos com nada. Temos tudo, mas nos sentimos injustiçados por não ter mais. É, eu sempre quero mais.
Hum, o que eu fiz da minha vida? Bem... Eu não plantei uma árvore, mas no pré-primário fiz crescer um pé de feijão em um copinho descartável com algodão. Também pretendo escrever um livro (juro que você estará na dedicatória). O filho? Eu dispenso!
Eu fico por aqui, tentando revelar-te mais um pouco dos meus dias longe de você. Dias que demoram e arrancam de mim a felicidade que eu tive.

Saltos

Eu recomecei.
Aperto o botão que liga o computador, sento-me confortavelmente na cadeira e coloco fones de ouvido imensos para que eu não escute nada além do som de Jeff Buckley. Porque hoje eu o quero completamente; quero que sentir a discografia impreguinar meus ouvidos e não me deixe dormir com ruídos...
Tento escrever algo concreto, uma resenha, uma crônica, mas tudo acaba em bolinhas de papel amassadas pelo chão do quarto e o caderno continua vazio, servindo de apoio para o óculos que já deixou a minha vista cansada.Eu continuo apertando esses pequenos botões com letras estampadas para formar palavras. Eu insisto em apertá-los como se de dentro de mim fosse sair explosões de frases bonitas; mas tudo fica sem sentido novamente.
Daí, eu penso em tomar um café, mas lembro que nem pra isso eu sirvo - já que não sei fazer café - e continuo com uma garrafa de água gelada e suada do meu lado. As gotas de água condensada caem até a superfície da mesa cinza, formando um desenho por baixo da garrafa. Um círculo que pode ser uma Lua Cheia ou um Sol.
Sinto-me vazia depois de um dia divertido. Sinto-me arrependida por gritar com quem não devia ou falar bobagens pra muitos por aí. Mas quem nunca se sentiu como uma rosa cheia de espinhos, a ponto de ferir alguém a qualquer momento?Quando sinto-me rosa, lembro daqueles olhos implorando por beijos. Aquele olhar intenso, daqueles que quando lembro o chôro faz a garganta doer, mas sequer sai pelos olhos. A frieza permanece pela metade dentro de mim. Tudo agora é pela metade. O bolo de chocolate, os filmes de domingo, o cobertor, a música, os shows, as noites, o eu-lírico e os livros... Tudo o que era completo, tornou-se metade.
O Jeff continua cantando - agora ele diz: "ela chora nos meus braços, andando ao brilho das luzes na aflição"
Voz clara, deliciosa que vai deslizando pelos meus ouvidos e faz com que eu enxergue tudo dentro de mim e com que eu possa sentir o coração pulsando mais rápido conforme os toques do violão.
O quarto ainda está na mesma posição, os objetos espalhados da mesma maneira. Não preciso de nada agora além da necessidade. Um dia eu encontro a chave.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

tentando ser poeta, ela envergonha-te

foto por: Day Medeiros

Saboreando vontades, eu me arrependo.
Me lambuzo de erros e com vontade lambo os beiços.
Saudade de não ter que fazer escolhas,
De ser criança, sair correndo do colégio e beber coca-cola no gargalo.
Aquela, de cinqüenta centavos.
Essa era a única escolha que eu tinha que tomar:
Coca-cola ou guaraná?
Os meus sonhos acordaram e eu me deparei com a contradição de ter que escolher entre um deles.
Saudade de sonhar,
Correr por madrugadas de sono
E viver onde os pássaros falam.
Eles não são de mentira.
Eles me fazem saborear os dias,
Por mais que os dias estejam lotados de erros. (Saborosos erros).

sábado, 1 de novembro de 2008

entrevista

A Indústria Fonográfica decaiu? As bandas tem mais dificuldade para crescer hoje em dia por causa dessa decadência?Em um papo descontraído com o Tyello, guitarrista da banda Dance of Days e mentor do estúdio Rock Together, eu descobri as vantagens de divulgar o som da sua banda pela Internet.
Sábado, 14 horas. Chego com meu amigo Douglas, baixista da banda Matriarka no Estúdio Rock Together. Não demora nem cinco minutos e Tyello vem nos atender. Super simpático e receptivo comecei explicando sobre o quê seria a entrevista e ele mostra certa timidez, com a justificativa de que está nervoso. Depois de uma conversa, e mais relaxada, eu inicio a entrevista para saber mais sobre a Indústria Musical atual.

Camila: Você acha que a Indústria Fonográfica saturou ou ela está buscando se adequar às novas tendências de distribuição?
Tyello: Eu acho que ela nunca quer se adequar, na verdade eu acho que ela está pouco se fodendo. Hoje no Brasil um CD custa 35 reais de uma banda nacional e eu acho isso um abuso. Deveria custar no máximo 15 reais. E esse alto custo dá margem à pirataria, download...

Camila: Você acha que hoje em dia o público ainda busca o mp3 como pesquisa?


Tyello: Bom, mp3 sempre como pesquisa, né. Eu, por exemplo sou amante de cds. Escuto a banda pelo mp3 na Internet e se eu gostar mando importar, vou comprar, mesmo de banda nacional eu compro. O CD pra mim nunca vai sair de moda.


Camila: Como o advento Internet modificou o meio musical? Por que hoje se faz tão necessário o uso da Internet pra divulgar a arte em si?
Tyello: Eu comecei a 14 anos atrás. O Dance of Days já tem 10 anos. Antigamente não tinha essa explosão da Internet, era tudo por carta. Aí surgiu a Internet o que melhorou na divulgação. Hoje mesmo podemos ver a quantidade de bandas que divulgam o som pela Internet. A Internet tornou essas bandas possíveis. Até mesmo o Fresno que era uma banda de internet, hoje em dia está grande. O Nx Zero também... A Internet é a cena; é a importância total pra cena.
Camila: Aqui no estúdio, ou até mesmo na banda, quais são as principais ferramentas de tecnologia ligadas à Internet que vocês utilizam? E o que você acha que ainda pode ser explorado nesse meio?
Tyello: Esse ano a gente lançou um álbum na Internet chamado "Álbum Virtual". Ele é disponibilizado inteiro pra download. Você baixa a capa e o conteúdo inteiro. E eu acho que essa é uma puta ferramenta, até pro estúdio é importante. Eu fico online aqui e as bandas já marcam o ensaio comigo, na hora. A Internet é tudo. Eu já não conseguiria viver sem a Internet.


Camila: E você acha que a Internet também é uma prova pras gravadoras e selos? Fica mais fácil escolher com quem trabalhar, sabendo o perfil de cada banda?
Tyello: Com certeza. Vai que um "Rick Bonadio da vida" está lá no computador dele e encontra o site da sua banda. E dá pra escolher as bandas, né. De falar: "Pô! Essa tem potencial, essa não..."

Camila: Com tanta informação e tecnologia, como você vê o futuro das bandas independentes dessa geração?
Tyello: Pô, tá vindo muita coisa. 2008 está meio saturado, mas tudo passa. Tem muita banda hoje em dia por causa da Internet. Mas depois que essa moda de bandas na Internet passar, eu acredito que a Internet continua e as bandas que sobreviverem a essa geração continuam.




Para quem quiser conhecer mais sobre a banda Dance of Days e o Estúdio Rock Together, acessem:
- http://www.fotolog.com/danceofdays
- http://www.fotolog.com/rocktogether

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Mudanças...


Foto por: Day Medeiros








Tudo muda todo dia, o tempo todo. Os dias mudam, mas parecem se repetir. As pessoas mudam, crescem, mas algumas parecem ter aquele mesmo pensamento quadrado e infantil de vinte anos atrás. Eu sempre pensei que o sinônimo de evolução fosse desenvolvimento. Mas são coisas completamente diferentes, descobri mais tarde.
As pessoas evoluem quando aceitam todas as realidades. Já o desenvolvimento é mais casual, depende do meio em que a pessoa vive.
Então, cheguei à conclusão de que a maioria das pessoas que eu conheci, passaram por um processo de desenvolvimento, não de evolução. Eu posso dizer que sou superior e evoluí? Não sei. Mas eu acredito que amadureci – e muito!
Já mudei tantas vezes, já quis ser tanta coisa! Mas no final, adquirir uma personalidade é a tarefa mais difícil para qualquer ser humano racional. Conquistar pessoas pelo seu tênis novo, jeito de se vestir e estilo musical é fácil. Difícil é agir honestamente e as pessoas ainda gostarem de você. Esse é o medo que a maioria dos jovens de hoje em dia enfrentam: o de ser aceito.
Várias vezes eu já vi garotas se beijarem para “causarem” na balada, mesmo sabendo que aquela não é sua realidade. Várias vezes eu já vi pessoas usando drogas para mostrarem pra todo mundo que são os “doidões”, que são fortes àquilo e que adoram aquela sensação momentânea de poder e liberdade; quando no dia seguinte acordarão podres e se arrependendo de tudo o que fizeram na noite passada. Coisa mais escrota que isso não existe.
Mas é tudo questão de tempo.
Eu já passei por bastante coisa pra ter plena consciência disso hoje. Hoje sei separar bem como devo agir em cada situação. Hoje eu já não saio durante três dias seguidos para beber e acordar na segunda-feira implorando por um ENGOV e muitas garrafas de água. E hoje já não mudo tanto as cores do meu cabelo.
A partir de um momento a gente começa a pensar no amanhã. Porque nas noites de baladas sem fim, o presente era mais importante e o pensamento “hedonista” predominava. Coisa de adolescente com crise de rebeldia que quer mais do que tudo atingir aquela liberdade que ele tem certeza que não existirá até sair da barra da saia da mãe. E mesmo sabendo que ainda depende dos pais, faz questão de chutar o balde e se esgoelar até fazer tudo o que quer.
Mas não tem como exigir liberdade sem passar confiança.
A partir do momento que você começa a mudar e enxergar a si mesmo do lado fora, o espanto é grande. Faz com que a cabeça funcione de uma vez por todas como se alguém apontasse o dedo na sua cara te dizendo o que fazer.
Sou péssima para escutar conselhos de outras pessoas, quando eu acho que eu estou certa – e isso acontece na maioria das vezes. Então, quando eu caio, o meu tombo é mil vezes maior, mas eu levanto como se nada tivesse acontecido e continuo a andar.






Porque se eu parar pra pensar nos conselhos que eu deveria ter escutado a vertigem volta.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

duas poesias e um poeta torto

Doce prisão

Adoça a vida, menina!
Coloca uma pastilha de menta na boca,
E canta pra todo mundo ouvir.
Quem dera se os sonhos fossem doces,
Quem dera se os dias não anoitecessem.
O dia acordou quente
O dia acordou raiando nos meus olhos,
Enquanto eu tentava dormir.
Adoça a vida!
Pula e grita
Pinta-se na cor do amor
E esbanja esse sorriso indeciso
De menina que não quer crescer.






Vontade de poesia
Queria ser poeta.
Num castelo em que a porta não se abre.
Encastelar-me em letras, em paixão
No último andar,
No sótão
Presa dentro de um copo de café
Quem sabe o perigo?
O perigo maior sou eu
Sozinha,
Cheia de objetos pontiagudos por perto
Será que eu consigo fugir?
Será que eu mereço escapar?
E eu escrevo pro tempo passar
Eu escrevo,
Até o príncipe encantado me salvar
E virar sapo
E eu virar trapo
Depois da meia noite.





P.S. - A foto é de Day Medeiros - (http://www.flickr.com/photos/daymedeiros). Postarei algumas fotos dela aqui.

Manda muito bem!

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Leve, de Chico Buarque.

Uma música que resume meus sentimentos nessa segunda-feira estranha;

"Não me leve a mal
Me leve à toa pela última vez
A um quiosque, ao planetário
Ao cais do porto, ao paço
O meu coração, meu coração
Meu coração parece que perde um pedaço, mas não
Me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo
Não se atire do terraço, não arranque minha cabeça
Da sua cortiça
Não beba muita cachaça, não se esqueça depressa de mim, sim?
Pense que eu cheguei de leve
Machuquei você de leve
E me retirei com pés de lã
Sei que o seu caminho amanhã será um caminho bom, mas não me leve
Não me leve a mal, me leve apenas para andar por aí
Na lagoa, no cemitério
Na areia, no mormaço
O meu coração, meu coração
Meu coração parece que perde um pedaço, mas não me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo
Não se atire do terraço, não arranque minha cabeça
Da sua cortiça
Não beba muita cachaça, não se esqueça depressa de mim, sim?
Pense como eu vim de leve
Machuquei você de leve
E me retirei com pés de lã
Sei que o seu caminho amanhã será tudo de bom, mas não me leve
O meu coração, meu coração
Meu coração parece que perde um pedaço, mas não me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo."

Minha relação com Chico Buarque vai além de tudo aquilo que é real.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Hein?!

Depois da dor de cabeça, veio o copo d’água. Depois do copo d’água, veio o Dorflex. Depois do Dorflex, veio o alívio. E como se já não bastasse todo esse processo para chegar ao alívio, depois ainda veio um barulho de martelo batendo n’alguma parede vizinha. Deitei, fechei os olhos – dessa vez com o travesseiro contra a minha cabeça – tentando me concentrar ou pensar que se tratava de algum tipo de brincadeira; torcendo, rezando pr’aquilo tudo passar de uma vez. O barulho continuava, freneticamente. Uma batida após a outra. Um, dois, um dois, um dois. Pá, pá, pá, pá. Ta, ta, ta, ta. Tum, tum, tum, tum. “Pára, pelo amor de Deus”, eu implorava em silêncio. Apertei os olhos, ainda com o travesseiro apertando minha cabeça que implorava por ar e rezei, meditei, fui até o céu em busca de algum Deus para pedir ajuda.O barulho parou. Graças aos céus. E o alívio voltou, desceu até a Terra, me buscando.Abri os olhos para verificar se não tinha risco algum de aquele barulho dos infernos voltar. Parecia que estava tudo bem. Voltei à minha típica posição de pegar no sono rápido e estava esperançosa em mais uma noite de descanso, já que eu adoro dormir. A partir desse momento comecei a acreditar no ditado que diz que “tudo pode piorar”. Pois é, não consegui dormir. Não conseguia dormir, caros amigos! Já estava puta da vida com a dor de cabeça, depois com o barulho do martelo e finalmente mais puta ainda por não conseguir dormir.Olhei para o teto. Comecei a contar carneirinhos. Não funcionou. Comecei então, a inventar algumas historinhas (alguns amigos me disseram que isso funciona); porém, caros amigos, não funcionou. “ Será que se eu tomar mais um Dorflex, eu durmo?”, pensei. “Não, tenho medo de tomar remédios em excesso”, afirmei em voz alta. Já estava tão lesada de sono, que comecei a falar sozinha, ou pensar alto. O pior, é que eu estava morta de sono e cansaço, mas não conseguia dormir. Sempre pensei que dormir fosse fácil, como algo do tipo “só deitar na cama, encontrar uma posição confortável e pronto”. Pela primeira vez eu peguei-me nessa situação. Mas vamos lá, eu não desisti.Tomei uma xícara de chá. “ E se eu tomar mais quatro xícaras?” Tomei mais quatro. Cinco xícaras de chá e eu fui me arrastando até a cama. Batata! Dormi feito um anjo.Até aí tudo bem. O mais estranho é que meu sono foi tão bom, mas tão realizado, que eu sonhei.Ta, tudo bem, sonhei, e daí?O que acontece, é que eu sonhei que eu estava dando à luz. Eu! Dando à luz e eram gêmeos. Gêmeos e ruivos. Mas, ruivos mesmo, daqueles branquelos e cheios de sardinhas espalhadas pelo rostinho. Tinham olhos claros e eram tão pequenos que pareciam dois ETEzinhos buscando pelos meus dedos de mãe.Eu, mãe! Imaginem.O mais estranho é que eu dava à luz em uma maternidade inteira cor-de-rosa, mas era TÃO cor-de-rosa que doíam os olhos. A mesa de parto era tão macia que parecia que eu estava deitada em algo extremamente doce, como um gigantesco marshmellow.A última coisa que eu me lembro, no sonho, é de um cara alto, de cabelos negros, batendo com um martelo roxo e verde na parede do quarto.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Morfina

Eu preciso reviver tudo. Eu preciso tirar da caixa cada memória. Botar na vitrola cada música. Chorar e cantar junto, no tom incorreto, no tom da dor. Eu preciso viver a perda. Não vai me matar. O que não nos mata nos fortalece, certo? E dizem que, quando a gente está prestes a morrer, a vida toda passa diante dos nossos olhos. E eu tenho que deixar isso morrer. Tenho que botar o amor na cama, cobri-lo até o pescoço, fazer uma balinha de cobertor, niná-lo feito criança - porque ele foi meu filho, no fim das contas. E, quando estiver bem adormecido, injetar bem no fundo de sua veia infinitas doses a mais de morfina do que qualquer ser vivo possa suportar. Eu preciso pôr o amor na cama. Eu preciso adormecer o amor. É preciso deixar morrer. Viver para deixar morrer. Reviver, relembrar. Relembrar é viver, não é? Então eu preciso relembrar tudo e lamentar cada momento bom que já está nas antigas. Chorar pelo que não volta - e chorar justamente porque não volta. Não se morre sem que se recapitule a história toda - afinal, o que está abafado está apenas abafado. É preciso revirar tudo, passar os olhos em tudo. Não se desapega de nada sem dar adeus.
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(Mas bem quando eu penso que a morfina já fez efeito, vejo que é alarme falso. Fazer morrer é muito, muito mais difícil do que se pensa. Outra fala que circula pelas ruas é a que diz que morre-se um pouco quando se mata alguém. Acho que, nesse caso, aconteceu o contrário. Estou tentando assassinar o que já corroeu boa parte de mim. O amor é como o câncer. Arranca muito da gente antes que possamos definitivamente arrancá-lo das nossas entranhas).

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Ursinhos.


Tem um ursinho na minha frente que não pára de me olhar. Ele é cinza, tem pernas compridas, pés e mãos grandes. Os seus olhos são costurados; dois risquinhos costurados. Ele tem um nariz preto que brilha. Não tem boca, por isso não fala. Mas eu sei que seus olhos enxergam tudo o que eu faço, porque um dia eu pensei bobagem e ele caiu encima do meu teclado, me acusado. Ele tentou suicidar meu pensamento. E eu fiquei bem quietinha, fingindo que a culpa não era minha. Minha mãe diz que os ursos não podem falar, nem brincar com a gente porque eles só têm espuma no cérebro. Mas eu acredito que de noite, quando eu durmo, o meu ursinho me abraça forte pra eu não ficar com medo, e conta baixinho no meu ouvido as orações do papai do céu.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Mais um devaneio.

Rendo-me ao sacrifício repetitivo e insignificante. Eu sei que deveria pender para o lado da maturidade, pois a responsabilidade nunca foi a minha cara; mas ao mesmo tempo gosto quando o vento toca meus cabelos anunciando a liberdade que eu tanto esperava ao sair de casa com minhas sandálias de salto.
O cigarro apagou pra sempre, dessa vez. As garrafas foram todas quebradas nas esquinas por onde eu ando. Tudo mudou em mim, menos os lugares que eu freqüento. De ruins, foram para lixinhos concentrados no centro da cidade aos olhos dos que vêem de fora, mas são lugares que me confortam, com pessoas que eu acostumei a conviver. Se eu escondo as marcas em meus olhos e em meus braços, é hoje sou bem mais consciente do efeito que elas poderiam causar anos atrás; e hoje poderiam causar a mim mesma aquela estranha sensação de nostalgia quebrando em ondas de frio dentro do meu estômago.
Hoje eu consigo abrir os olhos pra realidade, consigo discernir o certo do errado e separar a dor. Hoje a dor tem estágios, sei controlá-la. Hoje a dor é inexistente e o sofrimento permanente. É o sofrimento que faz com que meus olhos fiquem abertos, faz com que os apêndices fiquem atentos à dor da cicatriz.
Eu ainda abro um sorriso de deboche quando tentam entender o que eu escrevo ou quando dizem que tudo o que eu transmito em minhas letras são histórias baseadas na minha vida. Eu sempre adorei o romantismo literário, sempre quis ser personagem de algum livro e a atriz principal de alguma peça de teatro. Deve ser por isso que viajo quando começo a apertar estes botõezinhos compostos de letrinhas no teclado de frente pra tela do computador. O próximo passo é comprar uma máquina de escrever, pra que os escritos não fiquem em uma tela apenas, mas em um papel com cheiro de tinta fresca.
O próximo passo virá junto com um livro que espera uma inspiração do além para começar. E ultimamente as inspirações não têm sido minhas amigas. Elas preferem se esconder junto com as minhas cicatrizes debaixo da blusa, por trás dos meus olhos.

Agora meus dedos estão cansados. Vou voltar pra rendição de ser quem eu quero ser um dia.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Reveillon do horizonte.


Meu caro amigo,
Já é escuro e as ondas quebram em minhas pernas.
Eu olho para o horizonte,
Tento encontrar o meu sentido naquela imensidão,
Vejo que meu desejo é distante,
Volto à atenção aos meus pés que pulam as sete ondas
E sete lágrimas caem, deixando minha boca salgada
Assim como a água do mar.
Meu vestido branco está com a barra suja de areia
E minhas mãos soltam as flores brancas de Iemanjá.
Meus olhos piscam conforme as explosões acontecem no céu
Meu peito pulsa de emoção
Minha pele arrepia,
Minha boca ainda está gelada.
Todos se abraçam desejando a felicidade do ano seguinte
E meus braços buscam alguém pra abraçar também
Então eu volto a ser verdadeira
E enxergo a realidade onde meu mundo é só meu
Sem amores e emoções.
Volto pro apartamento vazio e abro a garrafa de sidra,
Olho para o meu gato e começo a me embriagar.
Queria tanto que estivesses aqui, amigo
Para embriagar-te na minha solidão.
Para mostrar-te que a vida ainda está amedrontada
Com os meus dias que não encontram as soluções
Que prendem o soluço do choro
O choro que lhe aguarda.

E a janela se fecha junto com a Lua e as estrelas que antes iluminavam meu quarto escuro.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Cotidiano

O mesmo travesseiro. Lençol. Chinelos. Banheiro. Água. Escova de dentes. Pasta de dentes. Gosto de Hortelã.
Pele arrepiada. Chuveiro ligado. Fumaça quente no ar. Sabonete. Chuveiro desligado. Pele arrepiada. Toalha.
Calcinha. Calça. Meias. Sutiã. Blusa. Blusa. Cachecol. Casaco. (tá frio!)
Chave. Portão. Guarda-Chuva. Ponto de ônibus. Pessoas. Banco. Janela. Rua. Metrô. Dinheiro. Banco. Janela. Portas automáticas. Estações. Lentidão. Mais pessoas.
Rua. Buzina. Caminhada. Prédio. Bom Dia. Elevador. Décimo quarto andar. Porta. Bom Dia. Cadeira. Computador. Banheiro. Água. Sabonete. Papel. Cadeira. Café. Café. Café.


Inicia-se o mesmo dia... Todos os dias.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Falando sobre Patti Smith

O que falar de uma mulher que apesar da fama nos 70’s, continua sendo uma das mulheres mais influentes (ela é inspiradora para musas desde Madonna até Courtney Love) e enigmáticas no mundo do rock?
Eu tinha 16 anos e estava na época “rebelde-sem-causa” da minha vida. Freqüentava baladas de rock e todos os shows da banda Ludovic. Adorava a retórica do vocalista, Jair e cantava loucamente as músicas junto a ele quando ele colocava o microfone na minha cara em alguns shows. Como toda boa fã, eu acompanhava as últimas informações da banda, até mesmo para saber em
qual próximo show eu garantiria meu ingresso. Até, que em uma sexta-feira, enquanto eu me arrumava para mais um show dos caras (desta vez na Funhouse), eu entrei no fotolog da banda para ler mais um dos textos do Jair Naves. No post, ele contava sobre um episódio na sala de sua casa, com sua mulher, escutando a faixa “Redondo Beach” de Patti Smith. A forma como ele descreveu o som e a maneira como Patti descrevia e declamava as palavras me deixou curiosa a ponto de no dia seguinte eu sair em busca do disco que levava aquela música no conteúdo. Assim, aos 16, fui apresentada a “Horses”, de 1975, primeiro disco do “Patti Smith Group”.
Desde então, o álbum foi trilha sonora dos meus 16 anos, fazendo com que eu acreditasse que não existia perfeição maior do que aqueles acordes de guitarra quebrados e aquela voz única. Eu lembro que colocava o CD pra tocar no REPEAT, até enjoar da dose diária de músicas como “Free Money” e “Kimberly”. “Redondo Beach” era para as viagens e “Horses” era a faixa que eu escutava religiosamente para fechar os olhos e dançar no meu quarto.
Eu fui surpreendida por uma mulher que fazia com que eu liberasse diversas sensações ao escutar suas músicas em uma época onde só Jim Morrison e os Doors tinham o poder de fazer isso comigo. Ela era poderosa, e eu fui perceber isso ainda mais, quando vi seus vídeos ao vivo.
Patricia Lee Smith subia no palco pra acabar com tudo, como um furacão: gritava no meio das músicas, contava histórias e pulava como se estivesse na sala de sua casa, como se ninguém estivesse assistindo. Aquilo fazia meus olhos brilharem mais ainda. “Isso é rock n’ roll”, pensava eu.
Segundo a própria, foi após ver um show dos Rolling Stones no Madison Square Garden, que pensou na possibilidade de unir as poesias que ela compunha ao rock. A idéia foi se concretizando e ao lado de Lenny Kaye – seu guitarrista e mentor musical – saiu em busca de músicos. Em novembro de 73, Patti e Lenny se apresentaram no “Rock n’ Rimbaud” no Le Jardin, em Nova York, junto com o pianista Richard Sohl, que ela conheceu pelo Danny Fields (executivo da gravadora e que tinha como missão principal buscar novos grupos). Assim, o trio começou a ensaiar regularmente e conseguiram unir a poesia de Patti com tons jazzísticos.
Seu último disco foi Twelve, de 2007, onde ela retoma a psicodelia dos 60’s, com covers de Jimmi Hendrix, Neil Young (ela interpreta fielmente ‘Helpless’), entre outros.
Patti fez um show em Curitiba, ano passado, que infelizmente eu não consegui comparecer. Esse é um show que me arrependo – e muito! – de não ter feito de tudo para ir. Com certeza ela abriria a minha caixinha de memórias e aguçaria meus sentidos de menina de dezesseis anos que acaba de descobrir o encanto da boa música.

Discografia de Patti Smith:


Horses (1975)
Radio Ethiopia (1976)
Easter (1978)
Wave (1979)
Dream of Life (1988)
Gone Again (1996)
The Patti Smith Masters: The CollectivePeace and Noise (1997)
Gung Ho (2000)
Land 1975-2002 (2002)
Trampin’ (2004)
Twelve (2007)

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Falando sobre Courtney Love

Fazia um bom tempo que eu não procurava nada sobre a minha –supostamente – musa do rock, a belíssima Courtney Love. Sem nada pra fazer, sem querer lembrei-me de como eu era –supostamente – apaixonada pela atitude da loira, pela sua voz e atitude. Comecei então a pesquisar as últimas notícias sobre a sua vida turbulenta. Pra começar, entrei no site oficial, que não é atualizado já faz um bom tempo e em seguida no myspace. Entrando no myspace, começou a rolar uma música que eu considerei “estranha” fazendo com que eu conferisse se eu estava no site certo. Uma música calma, no estilo “voz e violão”, fez com que eu abrisse cada vez mais os lábios em frente ao computador e eu me deparei com uma decepção que eu pensei que jamais teria em relação à Court. Fiquei paralisada até o último segundo da música e parti para a próxima, respirando fundo. A segunda música, intitulada “Car Crash”, fica no mesmo esquema: voz, violão e uma pegada pop-comercial, bem diferente do que eu estava acostumada a ouvir com o HOLE. Talvez, uma versão pop chiclete do seu último álbum “America’s Sweetheart”, que foi bem criticado com a balada “Mono”.
Fiquei pensando e pedindo em silêncio: “Deus, porque ela não parou no Hole?”.
Mas aí eu lembro que existe todo aquele amor do músico à profissão (ou ao dinheiro) que fala mais alto e os faz querer continuar nesse sonho de viver de música pra sempre, por mais que saibam que não surtirá o mesmo efeito do passado
Sei que fui um pouco radical com toda essa decepção, pois hoje em dia, na geração hip hop de mulherões da indústria da música, não existe espaço para grunges drogados pulando em baterias ou se cortando encima do palco. Mas é que eu pensava que a Courtney nunca iria envelhecer, iria ser pra sempre aquela tosca de vestido, com a guitarra na mão e o pé no retorno, cuspindo aquela voz rouca e revoltada. Nunca consegui vê-la como cantora pop e comportada.
Mas como a própria musa diz: “Rockstar, popstar, everybody die.”

Eu sabia que ela lançaria um cd no final desse ano, mas nessa busca de informações, descobri ainda, que o CD só sairá em 2009:

Courtney Love revelou detalhes exclusivos do seu álbum "Nobody's Daughter" (uma mudança de título do trabalho original "How Dirty Girls Get Clean").

Embora álbum fosse para esse mês, a data de lançamento foi jogada para 2009.

"Eu sei que parece que eu estou fazendo como Axl", ri, "mas eu juro por Deus que este não é a porra do 'Chinese Democracy'. Eu estou mais interessada em fazê-lo direito do que em lançá-lo. Eu estava tipo, em todos os lugares no meu último trabalho, mas eu tenho realizado agora esse. Eu não posso ser Mick e Keith ao mesmo tempo." [ela meio que se refere a fazer o papel da vocalista e do guitarrista principal] “Mas a indústria musical inteira, está basicamente fodida agora, e eu estou tentando trabalhar fora do paradigma que é o novo negócio. Eu não acho este que vá ser como 'In Rainbows', mas imaginaremos alguma coisa assim."

O álbum é co-produzido por Linda Perry e Michael Beinhorn. Embora tenha sido gravado em LA, Love revelou que consideraria um trabalho original de Ireland.

"Eu estava pensando de ir a Ireland fazer alguma gravação. Você sabe, num castelo velho perto de um rio, tipo, 100 libras por semana. Então eu estava falando com Bono, que me disse que da forma que as coisas estavam indo, eu acabaria com o meu dinheiro antes que a segunda música estivesse finalizada. Que merda aconteceu?"

"Realmente, eu tenho o guitarrista mais foda nesse trabalho," ela continua "Micko Larkin - ele estava numa banda chamada Larrikin Love. Ele apareceu cheirando a cerveja, mas no segundo que ele começou a tocar, eu sabia q ele era o garoto. Ele é melhor do que Keith Richards. Ele é melhor do que - Dane-se, eu vou dizer - Kurt Cobain!"

Falando do próprio, Love tem pesquisado recentemente a árvore genealógica, atrasada, de seu marido: "Se você voltar uns cem anos, a família de Kurt é toda original da região de Sligo. "Ele tinha a família mais fodida da cena. “Havia cinco irmãos - e quatro deles morreram baleados”

terça-feira, 23 de setembro de 2008

era uma vez um conto-de-fadas

Tudo estava dando certo e ela mal podia esperar até a campainha tocar. Os talheres de prata ao lado dos pratos de porcelana e as taças de cristal esperando o melhor vinho estavam alinhados encima da mesa de vidro.
O jantar estava quase pronto, e ela parecia uma daquelas donas de casa dos anos 50: vestido rodado até os joelhos, uma sandália bem abotoada e um avental estampado de flores miudinhas. A trilha sonora do seu “momento cozinheira” era “Me,myself and I” da aclamada Billy Holliday e entre um gole de vinho e outro, ela experimentava o seu risoto com um sorriso que ia de orelha a orelha.
Quando estava ficando pronto, a campainha toca. Ela vai atender, quase tropeçando de tanta ansiedade para vê-lo.
Ela abre a porta, olha bem nos seus olhos, pede para que ele entre e percebe que suas mãos estão para trás do corpo. Fica curiosa.
Sem êxito, ele avança para perto de seu corpo e lhe entrega um buquê de flores coloridas, dizendo que é para combinar com o arco-íris de seus olhos. Ela, envergonhada agradece dando-lhe um beijo na bochecha, sem esconder sua alegria.
Eles entram no apartamento, ela busca um vaso com água para as flores enquanto pede para ele se sentar. Volta para a cozinha para terminar o prato principal e canta alto para chamar atenção.
Enquanto isso, ele enche uma taça com vinho e vai até a cozinha para ajudá-la. Começa a beijar seu pescoço com as mãos em sua cintura. Ela vira de encontro ao seu rosto e começa a beijá-lo com vontade, até que se lembra do jantar.
Olha em seus olhos por um tempo e pensa no quão sortuda é por tê-lo em sua vida.
Durante o jantar começam a conversar sobre o dia e a semana que passou. Ela adora como ele fala sobre o seu emprego e de suas responsabilidades. Fica encantada com tanta garra em um homem só. Ele adora a maneira como ela fala sobre astrologia e a maneira como ela tenta surpreendê-lo com assuntos inteligentes.
O celular dele começa a tocar e a feição dela muda. Fica intrigada com a quantidade de pessoas que o procuram e com a falta de educação de não desligar o celular em um momento importante dos dois.
Ele diz que precisa atender e vai para a sacada.
Enquanto isso, ela acaba com uma garrafa de vinho e preocupada com a sua demora, vai até a sacada vigiar.
Chegando lá, escuta: “Não, meu bem, estou em uma reunião, quando eu sair daqui eu te ligo para irmos ao teatro, tudo bem, meu anjo?”
Ela derruba a taça de vinho no chão.
Assustado, ele olha pra trás.
Revoltada, ela começa a gritar e atirar tudo o que vê pela frente em sua direção.
Começam a discutir e ela o expulsa do apartamento.
“Não quero te ver nunca mais.”, revolta-se a donzela.
Terminou a noite com lágrimas pretas misturadas com vinho derramado em seu lençol branco, com a voz de Billy Holliday ao fundo do acontecimento. Triste, triste...


Todo conto-de-fadas termina em merda. Ninguém é feliz para sempre, sinto lhes informar!

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

digerindo a solidão

Entrou em seu quarto, abriu as janelas e mergulhou na sua cama para olhar o céu estampado de estrelas. Acendeu um cigarro e colocou “Redondo Beach” para tocar, no repeat. Ficou imaginando as cenas cuspidas pela voz da Patti Smith enquanto passava as mãos pelos cabelos (sua mania de todas as noites antes de dormir, já que não tinha ninguém pra lhe fazer carinho) e enquanto desejava que uma estrela cadente passasse ali, no momento do refrão.
Mas não aconteceu.
Tirou a roupa e sentiu-se livre de todo o dia que passou. Levantou da cama e foi em direção ao banheiro. Ligou o chuveiro e esperou a água esquentar bastante, até fazer com que o banheiro ficasse úmido, parecendo uma sauna. Entrou debaixo da água quente e começou a cantar em voz alta, livrando-se das reminiscências do dia anterior. Queria ficar ali debaixo pra sempre, molhando os cabelos e todo o rosto, deixando os dedos enrugados de tanta água quente...
Finalmente desligou o chuveiro e colocou o roupão convencional. Voltou para o quarto, para a cama, para a meia-luz e para a janela.
Seu gato já estava confortável debaixo dos lençóis e ela acendeu mais um cigarro; desta vez o tomaria com o chá que havia preparado antes de entrar no quarto. Tomou um gole de chá e deu mais um trago intenso em seu cigarro de menta. “De menta pra não deixar gosto ruim”, dizia para os curiosos. Mas a menta já estava tornando-se parte do seu enjôo diário, então ela prometia todos os dias que iria parar de fumar.
Ela queria parar de fumar, de beber e de sair para lugares que envolviam bebida e cigarros. Ela queria parar de comer animais e de fazer sexo sem amor. Ela queria ser uma estrela ou um gato para dormir o dia inteiro e acordar à noite.
Deitou-se na cama de lençóis pretos e travesseiros brancos. Deitou nua, para sentir a sua cama por inteiro e assim, descansar melhor. Voltou a olhar as estrelas e pensou na imensidão do céu e na vontade de estar tão longe dali. Olhou para seu gato – ele parecia compreender. Desligou o abajur cor-de-rosa e tentou dormir ao som da voz que mais adorava – a voz do silêncio.

Ela queria o mundo e nunca estava satisfeita com o mundo que tinha.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Liberdade de mim

Com uma arrogância invejável, coloquei o meu sapato de salto doze para que ela parecesse ainda maior, assim como o meu ego comprometido.Olhei para o espelho, passei o batom vermelho e como de costume, não sorri pra imagem que eu via refletida. Preferia continuar com o meu nariz em pé e com a boca dura.
Tocou a campainha, fui atendê-lo com um beijo – tão seco quanto eu – em seu rosto. Ele me olhou admirado, eu o olhei com desdém.Andando como uma garça, abri a porta do carro, sentei-me e abri os vidros para respirar.
Começou a vontade de liberdade. Não me lembrava que sensação de colocar a cara pra fora do vidro do carro é tão boa. Faz com que meus olhos se fechem naturalmente e que meu sorriso abra, deixando minhas bochechas adormecidas. Já não ligava pro penteado demorado que fiz se desmanchando, nem para o que as pessoas pensavam. Queria apenas que aquele momento tão idiota se tornasse inesquecível.Ele me olhava, ainda admirado, e tentava me convencer de que era melhor eu abrir os olhos.
Não satisfeita, saí ainda mais da janelinha e sentei-me nela, fazendo com que ele gritasse de medo. Meu cigarro já tinha apagado por causa do vento que ficava cada vez mais forte quando ele acelerava o carro.Joguei meus braços ao ar, e uma música tocava em meus ouvidos. Queria aquela sensação pra mim, queria agarrá-la de uma vez por todas! Ela não tinha o direito de escapar, tinha que ser minha!Mas o relógio marcou cinco horas da manhã e ele fez o caminho de volta pra minha casa.
“Quanto, a corrida?” – perguntei, com as bochechas vermelhas.
“Cento e vinte reais, senhora” – respondeu, amargurado por me deixar.
Paguei o que devia, e o táxi foi embora.Entrei em casa, tirei o salto e olhei pro espelho na parede do meu quarto. Dessa vez, sorri de volta pra imagem refletida. Cabelos embaraçados pelo vento, maquiagem intacta e pés não doloridos.
Queria a liberdade em tempo integral, mas ela só aparece quando o táxi chega em casa – E ele só vem na próxima semana.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Os meus doces venenos.

Existe uma prece do lado de dentro da garganta que precisa explodir. Precisa de voz grave e recepção dos ouvidos de alguém que tenha paciência pra escutar. O príncipe encantado é o culpado de tudo isso. Ninguém o mandou virar sapo quando eu mais precisava de um beijo e da experiência de amar alguém de verdade. Ninguém o mandou caçar as moscas enquanto eu estava disponível, a flor da pele.
A prece insiste em calar, insiste em me deixar com essa dor no peito e o nó na garganta, insiste em me fazer refém. Preciso de um grito constante, um berro ensurdecedor para matar a todos com meu ódio entalado. Ódio de quê? De quem?
Não sei. Apenas um sentimento a mais para fazer com que eu seja ainda mais confusa aos olhos alheios.
Fiquei parada no breu da noite, iluminada apenas por um feche de luz que passava pela janela meio aberta da casa a frente da calçada em que eu estava sentada. Calçada de terra e ninguém na rua. Fiquei a esperar alguém com bons ouvidos que jamais apareceria àquela hora da madrugada, para aliviar a dor de ser tão só.
Ao invés de me aproximar de alguém, preferia culpar as pessoas por eu ser tão sozinha. Preferia descarregar toda a minha injustiça no amor que as pessoas sentiam pela vida.
Talvez eu morra entalada de ódio.
A prece foi pro coração e o envenenou.